Explore a complexa interação entre neurodiversidade, romantização de transtornos mentais e patologização de comportamentos no ambiente de trabalho. Uma análise aprofundada que desafia as narrativas convencionais e propõe uma visão mais inclusiva e informada.
Em meio ao fascinante universo da Neurodiversidade, navegamos por uma maré de compreensões e interpretações. Este domínio, que celebra a variedade intrínseca às mentes humanas, propõe uma visão inclusiva e celebrativa das diferenças neurológicas. No entanto, o caminho para uma compreensão mais profunda e inclusiva da neurodiversidade é entrelaçado com desafios e nuances que exigem nossa atenção crítica.
“A neurodiversidade é o futuro da inovação e do progresso.” — Steve Silberman, autor e ativista. Autor de NeuroTribes*.
A neurodiversidade, muitas vezes vista através de lentes clínicas focadas no autismo e condições relacionadas, é, na verdade, um “alvo móvel” que responde tanto às demandas sociais quanto às diferenças neurológicas entre os indivíduos (Singer, 2017). A valorização de certas habilidades ou características associadas a condições como TDAH, autismo e AHSD (Altas Habilidades e Superdotação) tem sido romantizada, às vezes obscurecendo os desafios reais e o sofrimento que podem acompanhar esses transtornos.
Por outro lado, a patologização apressada de comportamentos, muitas vezes erroneamente rotulados como sintomáticos de transtornos mentais, pode ter raízes em questões nutricionais, fisiológicas, ou mesmo na indisciplina e na relação relapsa que temos com as exigências da modernidade que se reflete no autodiagnóstico e na exposição nas redes sociais que, ao que parece, traduz um FOMO nessa temática que, por vezes, justifica a baixa tolerância à frustração presente — e necessária — no processo de autoavaliação e desenvolvimento. Um olhar clínico apressado também pode perder a verdadeira natureza e causa de certos comportamentos, levando a diagnósticos errados e tratamentos ineficazes (Woods et al., 2018).
É aqui que a crítica proposta por Judy Singer nos anos 80 ganha relevância. Singer desejou dar crédito real aos ‘corpos e mentes diversos’, muitas vezes negligenciados nos estudos sobre deficiência. Ela viu na neurodiversidade um valor pragmático, especialmente nas pessoas autistas de alto funcionamento em certas ocupações. No entanto, a tendência de celebrar a neurodiversidade apenas quando é socialmente útil ou economicamente benéfica pode ser problemática.
“Não são todos os aspectos de sistemas operacionais humanos atípicos que são bugs.” — Steve Silberman*.
Além disso, a analogia comumente utilizada entre neurodiversidade e biodiversidade precisa ser posta em xeque. Assumir que o que é natural é sempre benéfico pode estar em desacordo com a realidade que se reflete no objetivo clínico de aliviar/reduzir o sofrimento possibilitando uma vida funcional que compreende as particularidades e correlações sempre multidimensionais — bio psicossocial (há fatores biológicos, questões comportamentais e construção/influência social) — um aspecto central na discussão da neurodiversidade
A reflexão crítica sobre essas questões é crucial para desenvolver uma abordagem mais adequada e eficaz para a neurodiversidade. Precisamos construir uma ponte entre a compreensão clínica e a aceitação social, garantindo que nossas respostas à neurodivergência sejam informadas, compreensivas e inclusivas.
É tempo de reavaliar nossas perspectivas, questionar as normas estabelecidas e cultivar uma compreensão mais profunda da neurodiversidade. O desafio é discernir quando um comportamento é realmente sintomático de um transtorno mental e quando é uma manifestação da individualidade humana ou de outros fatores não patológicos.
Referências
- Singer, J. (2017). Neurodiversity: the birth of an idea.
- Woods, R., Milton, D., Arnold, L., & Graby, S. (2018). Redefining Critical Autism Studies: a more inclusive interpretation. Disability & Society, 33(6), 974–979.