Eu juro que por vezes, me pego imaginando sobre o dia em que startups vão parar de idolatrar editais e programas de aceleração como a panaceia para todos os seus problemas. Antes de arremessar sua cópia de “Startup Enxuta”, não me entendam mal: reconheço e valorizo o impulso inicial que esses recursos podem oferecer. Afinal, quem recusaria uma injeção de capital ou o prestígio associado a um renomado acelerador(até mesmo quando ele não trouxe nenhum “Smart Money” para meu negócio)? Mas, quando essa ajuda externa se transforma no único plano viável para sustentar o negócio, algo está terrivelmente errado.
Depois de mais de 15 anos atuando com startups – até mesmo quando nem esse nome era comum – eu olho com muita preocupação como muitas jovens empresas se apegam a esses programas como náufragos a botes salva-vidas. A dependência de aprovações contínuas para seguir adiante é um sintoma claro de que a ideia central do negócio pode não ser tão sólida quanto deveria. A inovação raramente vem acompanhada de um cronograma de apresentações em painéis de jurados (mais uma motivação para o pessoal arremessar seus troféus e lembrancinhas dos SW e Hackthons que participaram).
Esse padrão repetitivo de buscar sempre o próximo edital, o próximo programa de aceleração, cria um ciclo vicioso. Muitas startups acabam girando em suas próprias órbitas de dependência, ao invés de realmente decolarem. A questão que resta é: até quando podemos chamar isso de empreendedorismo saudável e sustentável?
Edital Dependente? Um Caminho Perigoso
Vamos ser francos: se seu projeto não consegue respirar sem um fluxo constante de “dinheiro grátis”, talvez o problema não esteja nos recursos, mas no projeto em si.
A verdade é que muitas vezes nos perdemos na ilusão de que quanto mais apoio externo acumulamos, mais viáveis nossos negócios se tornam. É uma mentalidade perigosa. Esse comportamento não apenas mascara deficiências fundamentais no coração da nossa oferta, mas também nos torna complacentes. Acabamos dependendo dessas muletas financeiras, incapazes de caminhar pelo próprio esforço.
Não estou aqui para dizer que você deve recusar qualquer ajuda que possa acelerar seu crescimento. Pelo contrário, aproveite as oportunidades, mas com cautela. Use esses recursos como um trampolim, não como uma cadeira de rodas. Se sua startup é incapaz de gerar valor por si só, sem a infusão constante de capital externo, talvez seja hora de voltar à prancheta.
A sustentabilidade de um negócio não vem da quantidade de cheques de incentivo que se consegue encaixar na conta bancária. Ela vem da criação de um produto ou serviço que as pessoas realmente querem e precisam. Se você não está resolvendo um problema real para seus clientes, nenhum montante de dinheiro de editais vai converter seu empreendimento em um sucesso de longo prazo.
Perdidos na Tradução entre Visibilidade e Validação
O desfile em palcos e premiações pode até parecer atraente, mas o que realmente está por trás das cortinas? Um bocado de gente que troca a solidificação de um modelo de negócios robusto pela sedução de holofotes temporários. É uma troca perigosa. Enquanto os aplausos ecoam, a realidade do mercado espera lá fora, indiferente aos troféus na estante. E o mais complicado: os aplausos nem acabaram e já chegou mais um boleto e você não emitiu nem uma nota fiscal!
Muitos empreendedores, se deixam levar pelo brilho do palco e o reconhecimento durante aqueles minutos, pensando que eles validam existência empresarial. Mas a verdadeira validação não vem da quantidade de flashes ou apertos de mãos em eventos de networking. Ela vem de clientes reais, usando seu produto e declarando que não podem viver sem ele. Sem essa validação real, toda visibilidade é apenas fumaça sem fogo, desaparecendo tão rapidamente quanto aparece.
Lembre: inovação é solução criativa com boleto pago!
O Carrossel de Incubadoras: Diferentes Teses, Mesmo Círculo Vicioso e mais uma oportunidade e público para eu apanhar.
Você já parou para pensar em quantos programas de incubação já se inscreveu? E na quantidade de programas de aceleração que você submeteu apenas pelo dinheiro envolvido?
Algo que não é levado em conta – mas deveria – é que cada programa promete “uma nova revelação com sua própria tese” e, na verdade, é uma armadilha. Ao invés de nos proporcionar um crescimento tangível, esses programas muitas vezes nos fazem girar em círculos. A cada novo programa, uma nova promessa, uma nova tese, e nós, como mariposas atraídas pela luz, nos lançamos na esperança de que desta vez será diferente.
Mas o que realmente acontece? Em vez de avançar, encontramo-nos repetindo os mesmos erros ou, pior, confundindo nosso core business com as incessantes mudanças de foco sugeridas por mentores variados. Este é o verdadeiro círculo vicioso das incubadoras: muita rotação, pouco avanço. As startups precisam de consistência e foco para realmente evoluir. Sem isso, todos os esforços de incubação não passam de movimento sem progresso, deixando a startup exatamente onde começou, apenas mais desorientada.
Tá, tio! E quem eu devia tá ouvindo? Você?
Não! Pode me ignorar, se quiser (mas deixa uma curtida aqui no artigo. Me tornei aquilo que mais temia rs). Você precisa estar atento ao feedback real dos usuários. Na corrida para escalar, para impressionar investidores e adornar nossos pitch decks com métricas que parecem boas no papel, um componente crucial é frequentemente deixado para trás — o engajamento autêntico com quem realmente usa nosso produto.
Sem conversas honestas com nossos clientes, estamos apenas jogando no escuro. Estamos assumindo que sabemos o que eles querem, que nossa visão é imaculada. Mas aqui vai um spoiler baseado na realidade cruel do mercado: ele não perdoa. O mercado não tem interesse em nossas suposições ou nossas projeções infladas. Ele responde a produtos que resolvem problemas reais, a soluções que melhoram vidas de maneiras mensuráveis e significativas.
Vale apenas a exceção, aquele Investidor FDP (Financially Destructive Predator, traduzido “Predador Financeiramente Destrutivo”) que já abordei no artigo anterior. Que vai adorar inflar seu ego e injetar aquele dinheiro maroto por uma generosa contrapartida (societária) que enxerga um grande futuro ̶p̶a̶r̶a̶ ̶e̶l̶e̶ para seu projeto!
E como você sabe que está no caminho certo? Feedback. Esse é o oxigênio que mantém uma startup viva. É o que nos permite iterar, melhorar, e, eventualmente, inovar de maneira que ressoa verdadeiramente com aqueles que servimos. Ignorar esse feedback é como navegar um navio sem bússola em águas tumultuosas. Você pode ter uma ideia de onde quer ir, mas sem uma ferramenta para verificar seu curso, as chances de se perder são enormes.
Então, se você está se perguntando por que seu produto não está decolando apesar de todos os esforços e investimentos, pergunte-se: quando foi a última vez que você realmente ouviu seus usuários? Quando foi que você ajustou seu produto baseado no que eles disseram, e não no que você esperava que eles dissessem? Se você não consegue lembrar, talvez seja hora de começar a valorizar esse oxigênio antes que o ar se esgote.
Aqui, uma dica bonus: o ecossistema (ou a parte que funciona dele). Networking não é apenas aquele happy hour topissimo, meô! É sobre se cercar de pessoas que sabe mais do que você, que já estão há alguns “KMs” à frente e já passaram por alguns perrengues. Marque um café, bata um papo, converse, ouça também feedbacks de quem FEZ ALGO, não apenas TRABALHA COM PESSOAS QUE FAZEM (o que é comum quando falamos de ecossistema de startups. Esse é um assunto espinhoso para outro momento).
Métricas que Importam vs. Métricas para Inglês Ver
Métricas de vaidade podem enganar, e, admito, já fui seduzido por elas mais vezes do que gostaria de contar. Aqui, vou te dar aquela #DicaDoTio: Enquanto alguns de nós nos gabamos de números inflados em redes sociais ou quantidades exorbitantes de downloads que não se convertem em usuários ativos, esquecemos do que realmente impulsiona um negócio. São métricas como receita recorrente, taxa de retenção de clientes e o custo de aquisição de clientes que nos mostram a verdade nua e crua sobre a saúde da nossa empresa.
Não se deixe enganar pelo brilho superficial de “likes” e compartilhamentos. Embora esses números possam parecer bons em relatórios e apresentações, eles raramente indicam sucesso real ou sustentabilidade. Em vez disso, foque-se em métricas que refletem o verdadeiro valor que seu produto ou serviço traz para os clientes. Essas são as métricas que não apenas orientam, mas também sustentam um negócio a longo prazo.
Ufa! Mas alguma pancada? Não… por enquanto…
Chegamos ao fim – ou quase isso, pelo menos por hoje – deste desfile de realidades pouco confortáveis, mas necessárias. Como empreendedores, precisamos reconhecer quando estamos sendo seduzidos por caminhos que parecem fáceis ou que prometem glória imediata. O mundo dos negócios, especialmente no cenário das startups, é repleto de armadilhas disfarçadas de oportunidades.
É hora de amadurecermos. O caminho para um empreendimento bem-sucedido exige “um pouco mais” do que ganhar concursos ou acumular insígnias (graduações) de programas de aceleração. Exige um compromisso inabalável com a validação real, métricas significativas e, acima de tudo, uma solução que resolva problemas reais para pessoas reais.
Não deixemos que nossa jornada empreendedora se torne uma coleção de experiências vazias. Em vez disso, que cada passo que damos seja fundamentado, impactante e verdadeiramente inovador. Ao invés de ficar feliz com o aplauso fácil, que venha o #FazerDiferente que se traduz naquilo que entregamos para as pessoas.