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Você está pronto para desafiar o que pensa saber sobre TDAH no ambiente de trabalho? Vamos desconstruir cinco mitos comuns que estão longe da realidade e abrir nossos olhos para as verdadeiras capacidades dos adultos com TDAH. Quais desses mitos você ainda acredita?

por Júlio Diógenes


Após ser diagnosticado com TDAH e Autismo aos 26 anos, uma janela para um mundo até então desconhecido se abriu diante de mim. Essa história é longa e, em breve, vou estar gravando um video contando essa trajetória e alguns detalhes e particularidades. Se você já assistiu uma palestra minha é provável que conheça alguns detalhes, mas esta descoberta tardia não apenas redefiniu minha compreensão sobre mim mesmo, mas também – depois de alguns anos atuando no mercado corporativo – acendeu uma faísca de responsabilidade: a de desvendar e desmantelar os mitos enraizados sobre o TDAH que permeiam até mesmo os cantos mais modernos do nosso ambiente de trabalho.

Entender o TDAH não é apenas sobre conhecer suas características, mas desfazer as camadas de desinformação que afetam negativamente milhares de adultos, muitos dos quais podem nem sequer saber que possuem este diagnóstico. Cada mito desfeito é uma barreira a menos na inclusão e no aproveitamento pleno das capacidades de pessoas incrivelmente criativas e dinâmicas, que são frequentemente mal interpretadas devido a conceitos antigos e preconceituosos.

Mas, afinal de contas, quais são esses mitos que tanto distorcem nossa percepção sobre o TDAH e como eles impactam a vida real de pessoas como eu? Vamos desbravar essas falsas noções juntos e descobrir a verdade por trás de cada uma delas.

Aqui, cabe um aspas gigantesco e a oportunidade de apanhar de algumas pessoas:

Há pessoas que usam o TDAH com a muleta perfeita para não fazer nada sobre seus compromentimentos e também há aqueles que desejam o diagnóstico para justificar sua incapacidade de lidar com a própria vida. Isso dói, mas precisa ficar claro.

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Aceitação e compromisso são base da vida com qualquer transtorno. Aceitação do transtorno é sobre reconhecer os comprometimentos e prejuízos. Compromisso com o tratamento e com as adaptações que vamos precisar realizar em nossa vida, no nosso processo continuo de lidar com uma neurodivergência. Repito: você não tem culpa, mas tem responsabilidade sobre o seu transtorno. Apesar do óbvio, vale ressaltar: lógico que as pessoas e ambientes precisam de letramento e também fazer adaptações, mas isso só será feito quando você entender seu contexto e especificidades e agir. Não faça da Síndrome Solar sua regra (todos orbitam ao meu redor e do meu transtorno).

Mas, afinal de contas, quais são esses mitos que tanto distorcem nossa percepção sobre o TDAH e como eles impactam a vida real de pessoas como eu? Vamos desbravar essas falsas noções juntos e descobrir a verdade por trás de cada uma delas.

Mito 1: “Adultos com TDAH são preguiçosos e improdutivos.”

Vamos começar com um dos mitos mais irritantes e persistentes: a ideia de que adultos com TDAH são preguiçosos e improdutivos. Ah, como essa falácia me faz revirar os olhos! A desatenção e a procrastinação podem ser mal interpretadas como preguiça por quem observa de fora, sem entender a complexidade do que realmente acontece na mente de alguém com TDAH.

Falando por experiência própria, a realidade é dramaticamente diferente. O TDAH não me torna preguiçoso; pelo contrário, muitas vezes é a fonte da minha energia criativa e inovadora. Em ambientes que valorizam a rapidez de pensamento e a habilidade de juggle múltiplas ideias, eu e muitos outros com TDAH frequentemente nos destacamos. Por exemplo, em uma ocasião, durante um brainstorming intenso na empresa, fui capaz de lançar uma série de ideias inovadoras que levaram ao desenvolvimento de um novo produto, simplesmente porque meu cérebro hiperativo se conecta a pontos que outros podem não ver.

Então, antes de comprar a ideia de que somos preguiçosos, considere como sistemas tradicionais de trabalho podem não reconhecer ou aproveitar o modo único como operamos. A inovação não segue um cronograma das 9 às 5, e a criatividade certamente não bate ponto.

E sobre o TDAH desaparecer na idade adulta, isso realmente acontece? Vamos explorar isso no próximo mito e ver o que realmente permanece ao longo dos anos.

Mito 2: “TDAH é coisa de criança, adultos superam isso.”

Quando falamos sobre TDAH, frequentemente surge a crença de que é um “problema de criança” e que, de alguma forma mágica, simplesmente desaparece na vida adulta. Ah, se apenas fosse assim! A realidade é que o TDAH não é uma fase passageira, é uma parte integrante de quem sou, diagnosticado apenas aos 26 anos, após uma vida de desafios e descobertas.

O TDAH é uma condição neurológica duradoura, e a ideia de que alguém simplesmente “supera” revela uma falta grave de entendimento sobre o transtorno. A vida adulta com TDAH é um constante ajuste de estratégias e compensações. Por exemplo, aprendi que listas, lembretes e estratégias de gestão do tempo são essenciais no meu dia a dia para manter a produtividade e atender às expectativas no meu trabalho.

Esta jornada de autodescoberta e adaptação é contínua e requer uma compreensão profunda não só da parte de quem possui TDAH, mas também de colegas, empregadores e familiares. A empatia e o suporte são fundamentais para transformar potenciais desafios em histórias de sucesso.

Mas será que pessoas com TDAH realmente não conseguem se concentrar em nada? Vamos desmistificar mais esse conceito no próximo segmento.

Mito 3: “Se tem TDAH, não consegue se concentrar em nada.”

Este mito é incrivelmente persistente e, sinceramente, bastante frustrante. A ideia de que pessoas com TDAH estão perpetuamente distraídas é uma simplificação extremamente prejudicial. Sim, a batalha por manter o foco é uma realidade constante, mas existe uma dimensão menos conhecida que é crucial para entender nossa experiência: o fenômeno do hiperfoco.

A partir da minha própria vivência, o hiperfoco ocorre quando um assunto desperta meu interesse intenso; minha concentração se amplifica a tal ponto que praticamente tudo ao meu redor desaparece. Essa capacidade de imersão profunda é extremamente útil no ambiente de trabalho, especialmente em projetos que exigem dedicação contínua. Inúmeras vezes, esse estado de foco intenso permitiu-me resolver problemas complexos e completar tarefas com uma eficiência que muitas vezes surpreende meus colegas.

Além do hiperfoco, é importante destacar que pessoas com TDAH também podem alternar entre diferentes tipos de atenção. Podemos passar de momentos de grande dispersão para períodos de atenção seletiva ou dividida, ajustando-nos às necessidades do momento. Esta flexibilidade cognitiva, embora desafiadora, oferece uma versatilidade única no tratamento de múltiplas tarefas simultaneamente.

TDAH é apenas uma desculpa para não cumprir responsabilidades, certo?

Mito 4: “TDAH é apenas uma desculpa para não cumprir responsabilidades.”

Lembra do que eu falei logo no começo? Há aqueles que veem o TDAH como uma muleta perfeita para não lidar com suas responsabilidades. Isso dói, mas precisa ser dito. Enquanto existem pessoas que podem usar o diagnóstico como uma desculpa, a vasta maioria de nós luta diariamente para superar os desafios reais impostos por esta condição neurológica legítima.

O TDAH não é uma carta branca para irresponsabilidade. Pelo contrário, viver com TDAH significa enfrentar os comprometimentos e buscar ativamente maneiras de gerenciar a condição. No meu caso, isso envolve uma combinação de estratégias de organização, suporte de colegas e, crucialmente, um compromisso constante com o tratamento. Ferramentas como lembretes digitais, divisão de tarefas em etapas menores e intervalos regulares ajudam a manter o foco e a produtividade.

Este mito perpetua uma incompreensão dolorosa que pode minar o reconhecimento das lutas legítimas enfrentadas por aqueles de nós com TDAH. Aceitação e compromisso são fundamentais, não apenas para quem tem o transtorno, mas também para a sociedade que precisa se educar e adaptar para verdadeiramente apoiar cada indivíduo.

E, falando em adaptações e suporte, medicar resolve tudo, não resolve? Vamos explorar o último mito sobre o tratamento do TDAH e entender por que é apenas uma parte da solução.

Mito 5: “Basta medicar que o TDAH está resolvido.”

Vamos desvendar um dos mitos mais simplistas e comuns sobre o TDAH: a crença de que tudo se resolve com um comprimido. Embora a medicação seja uma parte crucial do tratamento para muitos, incluindo eu, pensar que é a única solução é reduzir um problema complexo a uma solução muito superficial. Além disso, existe uma realidade preocupante que eu chamo de “Doping Produtivo”, onde algumas pessoas sem diagnóstico de TDAH usam medicamentos como o Venvanse para tentar “aumentar sua performance”. Isso não só é perigoso como desvia o foco do verdadeiro propósito desses medicamentos.

Na minha experiência, a medicação ajuda a estabilizar minha capacidade de focar e controlar a hiperatividade, mas ela não é uma panaceia. Para realmente prosperar com TDAH, implementei ajustes significativos no meu ambiente de trabalho, como áreas mais silenciosas e o uso de tecnologia assistiva. Terapias comportamentais, incluindo treinamento em habilidades de gerenciamento do tempo e técnicas de mindfulness, também são componentes críticos do meu tratamento.

O caminho para uma gestão eficaz do TDAH envolve uma abordagem holística. Isso inclui não apenas o tratamento médico, mas também a educação contínua sobre o transtorno, a criação de ambientes adaptativos no trabalho e em casa, e o fomento de uma cultura que valoriza a neurodiversidade como uma forma de diversidade humana que tem muito a contribuir.

Portanto, enquanto a medicação é uma ferramenta valiosa e necessária para muitos de nós, ela é apenas uma parte do conjunto de estratégias necessário para manejar o TDAH efetivamente. No frigir dos ovos, é a combinação de tratamento médico, adaptações pessoais e suporte comunitário que realmente nos permite alcançar nosso potencial pleno.

#NoFrigirDosOvos

Vamos encarar os fatos: acabamos de desmontar cinco mitos sobre o TDAH que andam por aí, livres, leves e soltos, causando estragos nos nossos ambientes de trabalho. Desde noções antiquadas sobre preguiça até ideias simplistas de que um comprimidinho resolve tudo, cada ponto que abordamos aqui reflete a realidade multifacetada do TDAH e o imenso potencial que estamos deixando de lado.

Derrubar esses mitos não é apenas sobre ajustar mal-entendidos; é um chamado para construir ambientes de trabalho que realmente valorizam todos. Minha jornada pessoal com TDAH mostra que, ao derrubar esses preconceitos, não apenas as pessoas com neurodivergências se beneficiam, mas todos no ambiente de trabalho ganham. Uma inclusão real e uma compreensão profunda da neurodiversidade podem revolucionar a criatividade, a inovação e a coesão de equipe.

Então, que tal pararmos de esquentar a cadeira e fazer algo sobre isso? A educação sobre o TDAH e a neurodiversidade não pode parar por aqui. Cada debate, cada post, cada momento de aprendizado que desafia o status quo é um passo para um mundo profissional mais justo e inclusivo.


Quais outros mitos sobre o TDAH ou outras condições você acha que estão pedindo para ser derrubados? Deixe nos comentários e vamos continuar essa conversa!

Abração do Tio

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